A Pós-Modernidade e os Desafios da Educação na Atualidade

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Júlia Eugênia Gonçalves

Resumo

O presente artigo se propõe a apresentar uma visão da educação na pós-modernidade, a qual se encontra influenciada por perspectivas filosóficas que conduzem a produção de conhecimento e o saber acadêmico produzido nas universidades, na direção de modelos de pensamento transdisciplinar.

Palavras-chave
Educação; Pós-Modernidade; Transdisciplinaridade

Abstract

The present article proposes by itself to show a vision from education on post modernity, that is influenced by philosophical perscpectives that lead to the production of knowledge, and the academical knowledge produced on universities, fowards the direction of transdiciplinar thougths.

Keywords
Education; Post Modernity; Transdisciplinarity

O Conceito de Pós-Modernidade

O que se chama de pós-modernidade ou pós-modernismo é um movimento sócio-cultural que ganhou impulso a partir da segunda metade do século XX.

“Pós-modernismo é o nome aplicado às mudanças ocorridas nas ciências, nas artes e nas sociedades avançadas desde 1950, quando, por convenção, se encerra o modernismo(1900-1950). Ele nasce com a arquitetura e a computação nos anos 60. cresce ao entrar pela filosofia, durante os anos 70, como crítica da cultura ocidental. E amadurece hoje, alastrando-se na moda, no cinema, na música e no cotidiano programado pela tecnociência(ciência + tecnologia invadindo o cotidiano com desde alimentos processados até microcomputadores)sem que ninguém saiba se é decadência ou renascimento cultural.”

SANTOS, 1986. p.7-8

Este movimento caracteriza-se por uma severa crítica aos padrões éticos e estéticos que vigoraram no século passado e é típico das sociedades pós-industriais baseadas na informação. Passou a incorporar uma visão de mundo relacionada ao fim dos conflitos mundiais e à superação da “guerra-fria”.

Simbolicamente, pode-se dizer que surge com a explosão da bomba em Hiroxima e Nagazaki, fato que deixa o mundo perplexo diante do poder demonstrado pela ciência moderna e ganha impulso com os movimentos de contestação política na França de 1968.

Mais do que um movimento filosófico, o pós-modernismo é um paradigma sócio-cultural baseado em novas premissas para a vida e a sociedade humanas: a conquista do espaço extra-terrestre; os avanços da biologia molecular com a descoberta do DNA; o aumento desenfreado do consumo nas sociedades capitalistas e sua conseqüência mais imediata- o individualismo exacerbado; a liberação feminina; a música eletrônica; o niilismo nas artes em geral.

Em termos históricos o Pós-Modernismo acompanha a crise do pós-guerra e a extinção dos modelos comunistas/socialistas no mundo contemporâneo, assim como o avanço desenfreado do capitalismo em sua feição globalizada e neoliberal; testemunha o aumento da densidade populacional nos grandes e médios centros urbanos e a crise de valores que se sucede. Passa a expressar e ao mesmo tempo a criticar toda a lógica cultural do capitalismo avançado, estabelecendo a união entre arte, cultura e mercado.

O que sustenta este novo paradigma é a comunicação, baseada numa linguagem composta por signos. A Teoria da Comunicação e a Semiologia são as disciplinas que dão suporte ao pensamento pós-moderno. Os signos podem ser digitais ou analógicos. Os primeiros são as letras, números, palavras, porque são descontínuos e arbitrários; os segundos as imagens, fotos, gráficos que são contínuos e mantêm semelhança direta com o que representam. Os signos digitais permitem escolher, os analógicos permitem reconhecer ou compreender.

“Com a invasão da computação digital no cotidiano… estamos assistindo à digitalização do social… O bit é a base lógica do computador e constitui, atualmente, o gargalo binário por onde o social está sendo forçado a passar. Na pós-modernidade, o indivíduo vive banhado num rio de testes permanentes. Digitalizados, os signos pedem escolha. Não uma decisão profunda, existencial, mas uma resposta rápida, impulsiva, boa para o consumo.”

SANTOS, 1986.p.16-17

Provavelmente as artes em geral e as artes plásticas em particular, tenham sido os aspectos da cultura nos quais o pós-modernismo ficou mais evidente. Em relação ao movimento modernista guarda diferenças profundas, como aquelas que reproduzimos na tabela abaixo:

Modernismo e Pós-Modernismo
Modernismo Pós-Modernismo
Cultura elevada Cotidiano banalizado
Arte Antiarte
Estetização Desestetização
Interpretação Apresentação
Obra/originalidade Processo/ pastiche
Forma/abstração Conteúdo/figuração
Hermetismo Fácil compreensão
Conhecimento superior Jogo com a arte
Oposição ao público Participação do público
Crítica cultural Comentário cômico, social
Afirmação da arte Desvalorização obra/autor

FONTE: SANTOS, 1986.p.41-42

Visão Filosófica da Pós-Modernidade

O pós-modernismo chega à filosofia como uma tentativa de desconstruir o discurso filosófico ocidental a partir do próprio discurso, tal qual foi elaborado desde a antiguidade clássica.

“Desconstruir o discurso não é destruí-lo, nem mostrar como foi construído, mas pôr a nu o não dito por trás do que foi dito, buscar o silenciado (reprimido) sob o que foi falado”.

SANTOS,1986.p.71

O prefixo “pós” indica o que vem depois, o que sucede à modernidade, significando um corte, uma ruptura não apenas no âmbito da política e da economia mas, sobretudo, no pensamento das pessoas, as quais compreendem que estão vivendo uma fase de grandes transformações que afetam a todos direta ou indiretamente e que é necessário compreender seu significado no contexto da sociedade como um todo.

Há então um afastamento em relação ao “moderno” no sentido de que a filosofia pós-moderna vai reivindicar uma posição amadurecida frente ao modelo positivista, característico do que se convencionou chamar de “modernidade”.

A chamada Escola Filosófica de Frankfurt representada por Horkheimer, Adorno e Habermas, dentre outros, vai ser a pioneira na reflexão sobre as mudanças sofridas na sociedade ocidental do pós-guerra. Tendo sido fundada com o objetivo de realizar estudos aprofundados sobre o marxismo, sua orientação de estudos e pesquisas inicialmente teve ênfase econômica, mas ganha impulso filosófico a partir do momento em que Horkheimer assume a direção do Instituto de Investigação Social, vinculado à Universidade de Frankfurt. Com ele surge a chamada Teoria Crítica, guia teórico deste grupo, nos anos seguintes.

A Escola de Frankfurt passa então a refletir sobre o destino do homem que é membro de uma comunidade, que vive em uma sociedade. Isso leva necessariamente a uma articulação entre conhecimentos filosóficos, sociológicos, econômicos e antropológicos, estreitando, desta forma, os laços entre a Filosofia e a Ciência, na medida em que esta se baseia em dados empíricos, diminuindo a dicotomia entre estes dois campos do conhecimento humano.

Estas propostas ensejam trabalhos de natureza interdisciplinar, pois a compreensão da vida humana no contexto social exigia a conexão entre vários campos científicos e entre estes e a Filosofia, que não podia mais partir de uma compreensão abstrata dos indivíduos, fora de seu contexto.

A Teoria Crítica acentua os aspectos da relação Filosofia-Ciência, interdisciplinaridade e totalidade, introduzindo um vetor menos economicista no marxismo e chamando a atenção para os aspectos psicológicos contidos no social, sobretudo com a adesão de Eric Fromm ao grupo, que agrega os conhecimentos da psicanálise às discussões.
Com a guerra na Europa, muitos dos integrantes da Escola de Frankfurt são levados a emigrar, primeiramente para Genebra, depois para Londres e Paris e, por fim, para os EEUU, onde ficariam sediados em Nova York desde 1934 até o retorno para a Alemanha, em 1950.

O período americano foi profícuo para o amadurecimento da Teoria Crítica, que passa a analisar a natureza do fascismo, a investigar as características psicossociais dos indivíduos e outros temas relevantes para a época, tais como a revisão da filosofia positivista e os preconceitos contra os judeus, comprometendo-se com a transformação da sociedade. Questões referentes à cultura de massa, mídia, sociedade de consumo e proliferação de signos, articulação arte e sociedade, assim como as mudanças econômicas que levaram à globalização e ao multiculturalismo passam a ser objeto de atenção deste grupo, que reconhece a resistência do sistema capitalista, muito hábil em superar as crises que o assolam.

Na França há também um movimento de pensadores que discute a condição pós-moderna. Dentre eles, destacam-se Baudrillard e Lyotard.

Baudrillard vê a pós-modernidade como uma implosão do social como um todo e centra seu trabalho no fim da era de modernidade, dominada pela produção e pelo capitalismo industrial, caracterizada pela tecnologia e pelo consumo e no advento de uma era pós-moderna, constituída por novas formas de tecnologia, cultura e sociedade.

Lyotard apresenta este período não como uma escola unificada de pensamento, mas como uma perspectiva que rejeita um pensamento totalizante e os referenciais universais iluministas e que implode a razão moderna.

Taschner, 1 analisando as posições destes filósofos, conclui que Lyotard põe em cheque as grandes narrativas que caracterizaram a modernidade, pautando sua análise na esfera lingüística; que Baudrillard considera que o social transformou-se, na pós-modernidade, em um simulacro de si mesmo tendendo para o desaparecimento e que Habermas sequer aceita a expressão pós-modernidade, por julgar que o que vivemos é resquício de uma modernidade que ainda não se completou.

Tem sido comum caracterizar a pós-modernidade como um movimento de negação, como uma oposição à modernidade, a partir da leitura de seus filósofos. Isso traz algumas dificuldades, que podem ser exemplificadas pelo prefixo “pós”, já referido: ele significa o que vem depois, o que sucede e, portanto, traz em si a idéia de linearidade, conceito negado pelo próprio movimento.

O que se verifica é que a pós-modernidade muda o enfoque sobre o sujeito, situado pelo Iluminismo como um ser superior e localizado, com um perfil eurocêntrico, branco, machista e colonizador. A relação sujeito/objeto, dirigida pelo primeiro, privilegiava o segundo e acabava “objetivando“ o convívio humano. O movimento pós-moderno passa a considerar o par sujeito /objeto sob uma nova ótica, valorizando esta relação sob um ponto de vista humanista e ecológico, que pauta suas ações pela cooperação e pela solidariedade e não mais pelo domínio e competição. Esta mudança de perspectiva traz profundas alterações no entendimento do conhecimento científico, que vai se comprometer com novas promessas, baseadas em novos pressupostos, os quais, a priori, não podem garantir verdade e felicidade.

“.. fica abalada até mesmo a máxima Kantiana do “ caminho seguro da Ciência”. Como veremos, esse desaguadouro – na medida em que se pretende um campo desdogmatizado – implica uma postura de humildade frente ao conhecimento em geral, e frente, especialmente, ao conhecimento científico.”

VEIGA NETO, 1997. p.3.

Houve um deslocamento do foco das investigações, que deixaram de lado a busca das bases racionais sólidas sobre as quais se poderia erigir um conhecimento científico seguro, para a busca da compreensão das próprias práticas científicas, seus produtos e suas relações com a sociedade. Passou-se da reflexão metafísica e da investigação lógica para a investigação histórica, hermenêutica, compreensiva. Como conseqüência desta mudança a ciência não foi mais submetida ao tribunal da razão e passou a se comprometer com o futuro da humanidade, com seus efeitos morais e com a construção de uma sociedade mais cooperativa.

Influência da Pós-Modernidade na Organização dos Conhecimentos

De acordo com o pensamento pós-moderno, as formas de conhecer e de pensar o conhecimento não pode mais seguir uma lógica mecanicista e determinista. As repercussões da globalização sobre as maneiras de se pensar e sentir, viver e agir no mundo, afetam as concepções filosóficas sobre a realidade. Espaço territoriais sem fronteiras, mercados comuns, moedas transnacionais são desafios para a mente humana que não podem coexistir com conhecimentos divididos, hierarquizados, sistematizados:

“A insistência na divisão do saber em disciplinas só tende a perpetuar e aprofundar as tensões. A educação disciplinar constitui-se num sistema fundado com base em valores de outros séculos, o que ratifica seu descompasso com as aceleradas mudanças contemporâneas”.

STRIEDER, 2000.p.76

O conhecimento humano passa a ser visto com o auxílio de outros vetores, os quais evoluem de posturas disciplinares, interdisciplinares, multidisciplinares para atitudes transdisciplinares. Para se compreender tal evolução de pontos de vista, é mister que se faça uma apreciação destes termos:

A atitude disciplinar frente ao conhecimento humano, como já se viu, é fruto da visão cartesiana moderna que tinha no processo mental da análise sua base interpretativa, seguindo a suposição de que para conhecer o todo é preciso compreender as partes.

No início do século XX, esta visão foi substituída por duas outras, que coexistiram durante várias décadas: a interdisciplinaridade e a multidisciplinaridade ou pluridisciplinaridade. A primeira diz respeito a uma transferência de método de uma disciplina para outra, abrindo espaços, algumas vezes, para o aparecimento de novas contribuições no campo das ciências, mas seus objetivos permanecem afeitos ao âmbito das disciplinas.

“Interdisciplinaridade… diz respeito à transferência de métodos de uma disciplina à outra. Podemos distinguir três graus de interdisciplinaridade: a) um grau de aplicação . Por exemplo, quando os métodos da física nuclear são transferidos para a medicina, resultam no aparecimento de novos tratamentos de câncer; b) um grau epistemológico. Por exemplo, transferindo os métodos da lógica formal para a área do direito geral, geram análises interessantes de epistemologia do direito; c) um grau de geração de novas disciplinas. Por exemplo, quando métodos da matemática foram transferidos para a física geraram a física matemática e, quando transferidos para os fenômenos meteorológicos ou para os processos do mercado de ações, geraram a teoria do caos; transferindo métodos da física de partículas para a astrofísica, produziu-se a cosmologia quântica e, transferindo métodos computacionais para a arte, obteve-se a arte computacional.”

NICOLESCU,1997. Conferência no Congresso International “A Responsabilidade da Universidade

A este respeito, Rieder1, traz informações do Grupo MULTIRIO, da Secretaria Municipal de Educação do Estado do Rio de Janeiro, baseadas nas reflexões do filósofo brasileiro, Hilton Japiassu. Segundo os documentos produzidos por este grupo, os termos multi ou pluridisciplinaridade indicam uma justaposição ou a integração de conteúdos de disciplinas distintas sob o ponto de vista de seus métodos, teorias e conhecimentos. É feita uma distinção entre estes dois conceitos:

“No sistema multidisciplinar uma gama de disciplinas são propostas simultaneamente para estudar um objeto sem que apareçam as relações entre elas”·

“No sistema pluridisciplinar justapõem-se disciplinas situadas no mesmo nível hierárquico de modo a que se estabeleçam relações entre elas”.

Secretaria Municipal de Educação do Rio de Janeiro, 1998.

Quanto ao termo interdisciplinar, o documento explicita:

“Em relação à interdisciplinaridade tem-se uma relação de reciprocidade, de mutualidade, em regime de co-propriedade que possibilita um diálogo mais fecundo entre os vários campos do saber.
A exigência interdisciplinar impõe a cada disciplina que transcenda sua especialidade formando consciência de seus próprios limites para acolher as contribuições de outras disciplinas.
A interdisciplinaridade provoca trocas generalizadas de informações e de críticas, amplia a formação geral e questiona a acomodação dos pressupostos implícitos em cada área, fortalecendo o trabalho de equipe. Em vez de disciplinas fragmentadas, a interdisciplinaridade postula a construção de interconexões apresentando-se como arma eficaz contra a pulverização do saber.”

Secretaria Municipal de Educação do Rio de Janeiro,1998.

Pode-se depreender destas afirmações, que as propostas interdisciplinares ou multidisciplinares correspondem a avanços na maneira de pensar o conhecimento humano, porém ainda estão, em grande medida, presas aos domínios das disciplinas.

O progresso das teorias filosóficas pós-modernas exigia novas formulações para a Ciência que se configurava no final do século XX. Isto se formalizou por ocasião do primeiro Congresso Internacional da Transdisciplinaridade, realizado no convento de Arrábida, em Portugal, de 3 a 7 de novembro de 1994, do qual resultou a Carta da Transdisciplinaridade1 , redigida por Lima de Freitas, Edgar Morin e Basarab Nicolescu, adotada por seus participantes e aberta à assinatura de todo ser humano interessado em medidas progressistas de ordem nacional ou internacional.

Apesar de ter sido formalizada neste evento há quase dez anos, a palavra transdisciplinaridade ainda não é empregada com a freqüência e propriedade que se poderia esperar. Random2 alega que ela traz em si uma ambigüidade conceitual contida na presença do prefixo “trans” juntamente com a palavra “disciplina”: enquanto o prefixo aponta uma abertura, a palavra traz em si o significado do fechamento. Isso, a seu ver, dificulta sua assimilação pelo público. Porém, este autor acredita que exista algo mais. Ele considera a dinâmica implícita entre as duas partes do conceito, que permite ir além das qualidades próprias das disciplinas, comunicando-se entre si nos mais altos níveis possíveis, como pressuposto para uma tomada de consciência a respeito da complexidade da própria vida.

“O pensamento transdisciplinar é precisamente uma primeira abertura, uma ação concreta sobre a nossa realidade, para nela inserir a visão de um real global e não mais causal, revelado pela nova física quântica, um real” holístico “no qual todos os aspectos da realidade podem ser considerados e respeitados, sejam eles científicos, materiais, afetivos ou espirituais”.

RANDOM,2000.p.19

Nicolescu1 trabalha este conceito com mais profundidade. Esclarece que o prefixo “trans” designa aquilo que está ao mesmo tempo entre as disciplinas, através das diferentes disciplinas e além de qualquer disciplina. Que isto só pode ser compreendido quando se supera o pensamento clássico, segundo o qual a transdisciplinaridade seria um absurdo inconcebível posto que no espaço entre as disciplinas, ou além delas, só existiria o vazio, já que cada disciplina, de per si, conteria um campo de abrangência e pertinência inesgotável.

Entretanto, segundo a visão pós-moderna influenciada pela física quântica, a realidade não é una, o conhecimento não é fragmentado e o pensamento clássico não é absurdo, mas seu campo de aplicação é restrito.

“Diante de vários níveis de Realidade, o espaço entre as disciplinas e além delas está cheio, como o vazio quântico está cheio de todas as potencialidades: da partícula quântica às galáxias, do quark aos elementos pesados que condicionam o aparecimento da vida no Universo”.

NICOLESCU,1999. p.46.

Daí ele infere que o espaço transdisciplinar só pode ser pensado de forma descontínua, já que se configura em oposição à continuidade inerente ao espaço concebido pela física clássica, compreendido como um encadeamento contínuo de causas e efeitos. A noção de descontinuidade, um dos pilares do pensamento pós-moderno, foi apresentada por Planck no começo do século XX, ao descobrir que a energia tem uma estrutura discreta, descontínua: o”quantum”1, que iria subsidiar a mecânica quântica e reformular completamente a visão de mundo com o surgimento da física quântica disseminada após a segunda guerra mundial. Com ela evidencia-se um novo tipo de causalidade, segundo a qual as entidades quânticas continuam a interagir qualquer que seja seu afastamento, já que são concernentes a um sistema que engloba todas as entidades físicas em seu conjunto.

Este autor acrescenta que a transdisciplinaridade, enquanto relacionada com a descontinuidade, representa a superação da visão dicotômica e dualista dos tempos modernos.

“A transdisciplinaridade é a transgressão da dualidade que opõe os pares binários: sujeito-objeto, subjetividade-objetividade, matéria-consciência, natureza-divino, simplicidade-complexidade, reducionismo-holismo, diversidade-unidade. Esta dualidade é transgredida pela unidade aberta que engloba tanto o Universo como o ser humano.”

NICOLESCU,1999.p.57.

Conclusão

O conceito pós-moderno de “transdisciplinaridade” tem sido aceito no ambiente universitário, como aponta Brandão, porque se coaduna com o espírito da Universidade.

“Não é sem razão que o ambiente acadêmico das universidades se volta para pensar o ensino e a geração do saber dentro de uma forma transdisciplinar que vá além da perspectiva multidisciplinar e, mesmo, da interdisciplinaridade. As universidades foram criadas para abarcar todo o conhecimento relevante e providenciar pesquisas de ponta. Contudo, a quantidade de informações existentes e transmitidas, sobretudo através das redes de informática, torna impossível dominar todas as informações sobre um determinado assunto. Mesmo se o conseguíssemos, não nos restaria tempo para trabalhá-las e explorá-las devidamente. Além disso, o conhecimento de fronteira, por sua própria definição, leva a por em contato os conteúdos de um campo de saber com os conteúdos de outros campos, aproximados pelo desdobramento das pesquisas. Ao pesquisador realmente” “universitário” torna-se impossível permanecer cego àquilo que cai sob sua perspectiva, razão pela qual ele se obriga a percorrer caminhos que vão além de sua disciplina específica.”

Cfr.BRANDÃO,2000.disponível en internet http://www.arq.ufmg.br/ia/trans%20e%20humanismo

Apesar da adoção da “abordagem transdisciplinar” nas Universidades, sobretudo nos cursos de formação em novos campos do conhecimento humano, tais como a mecatrônica, a bioquímica ,a biomedicina ou a psicopedagogia, não deixa de existir, nos meios acadêmicos, alguma reserva ao conceito de trasndisciplinaridade, já que sua adoção importa numa revisão das estratégias de conhecimento desenvolvida na modernidade e que ainda não caíram em desuso.

Há uma desconfiança no que tange às metodologias gerais que podem ser transportadas de um campo do conhecimento a outro. Esse “ir além” que está contido no prefixo “trans” é visto como ênfase no estabelecimento de um método geral para as disciplinas,como se os métodos específicos fossem insuficientes para a compreensão do real em sua totalidade. É novamente Brandão quem traz esta questão:

“Não se trata de uma aversão à metodologia em sentido estrito, mas a desconfiança de que a dedicação excessiva a problemas metodológicos leva a uma hipertrofia dos meios e seu descomprometimento com os fins do saber. Essa desconfiança já se encontra tematizada em Hans-Georg Gadamer em seu Verdade e Método e fundamenta o neopragmatismo da filosofia de R. Rorty.Também na filosofia de Leon Battista Alberti (1404-1472), tal desconfiança em relação à sofisticação metodológica da escolástica se apresenta atrás do seu epíteto Quid tum?”

Cfr. BRANDÃO, 2000. disponível en internet http://www.arq.ufmg.br/ia/trans%20e%20humanismo

Há também uma desconfiança em relação à adoção de uma hermenêutica geral que o conceito de transdisciplinaridade implica pois, segundo este ponto de vista, é preciso que os conceitos de uma disciplina sejam traduzidos no âmbito de outra disciplina. Isso implica num esforço compreensivo muito grande.

Como espaço sem fronteiras e limites disciplinares, a transdisicplinaridade pode se situar tanto além como aquém das disciplinas, e esse é o perigo que corre um conceito num mundo no qual a busca de “novidades” impede o exercício da racionalidade. Pode servir apenas para promover a passividade e a inibição do pensamento, diante de uma rede de informações tão intensa como a que temos na atualidade.

Por outro lado, é preciso lembrar que grandes gênios , como Leonardo Da Vinci, transitavam tranqüilamente da arte para a engenharia, de ciência humana para ciência exata, sem perda de conteúdo e criticidade. A transdisciplinaridade, não é, de forma alguma, a abolição das disciplinas, mas a formação de sínteses disciplinares inovadoras e criativas, capazes de explicar o Universo e a Realidade sob uma nova ótica e uma nova ética.

Cumpre à educação pós-moderna tal objetivo, como forma de responder ás novas necessidades de um mundo, globalizado, complexo, sistêmico, tecnológico que exige do ser humano novas respostas.

Bibliografia

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  • LYOTARD, J.F. (1988) O Pós-Moderno. Rio de janeiro: José Olímpio.
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  • NICOLESCU, B. (1999) O Manifesto da Transdisciplinaridade;tradução de Lúcia Pereira de Souza. São Paulo; Triom.
  • _____________(1997). Conferência no Congresso Internacional “A Responsabilidade da Universidade para com a Sociedade”, International Association of Universities, Chulalongkorn University, Bangkok, Thailand. Disponível em http://perso.club-internet.fr/nicol/ciret/
  • SANTOS, Boaventura Sousa.(2000) A Crítica da Razão Indolente. Contra o Desperdício da Experiência: para um novo senso comum; a ciência, o direito e a política na transição paradigmática .Vol 1. São Paulo: Cortez.
  • STRIEDER, Roque.(2000) Educar para a Iniciativa e a Solidariedade. Ijuí:Ed.UNIJUÍ.(Coleção Educação).
  • TASCHNER, Gisela B. (1999), A Pós Modernidade e a Sociologia. Revista USP, São Paulo, nº 42.ju/agosto. p 6 -19.
MINICURRÍCULO DO AUTOR

Doutoranda em Filosofia e Ciências da Educação pela Universidade de León, Espanha, meste em Educação pela Universidade Federal Fluminense, RJ, psicopedagoga, membro do Conselho Nacional da ABPp- Associação Brasileira de Psicopedagogia.

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