Tecnologia em Gastronomia: Estudo Exploratório dos Cursos Segundo seus Atores

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Marcelo Neri Belculfine
Renê Corrêa Do Nascimento

Resumo

O presente artigo aborda a oferta de graduação tecnológica em gastronomia, através de pesquisa exploratório-descritiva, de cunho qualitativo na medida em que trabalha as informações juntos aos distintos atores que diretamente se expõem à ela, ou seja: alunos, docentes, coordenadores de curso e empregadores. Em seu processo de desenvolvimento foram aplicados questionários semi-estruturados junto à amostra contemplando os sujeitos já enunciados. Analisou-se por meio da percepção dos respondentes, por conseqüência, a pertinência de cursos oferecidos por duas Universidades localizadas na cidade de São Paulo. Cabe ressaltar que essa análise se deu no propósito de verificar e compreender se, nas suas propostas acadêmicas, se evidenciam situações e conteúdos alinhados aos interesses da formação do futuro profissional em gastronomia.

Palavras-chave

Graduação. Tecnologia. Gastronomia. Formação Profissional. Mercado de trabalho

Abstract

The present article, about the associate degree in culinary arts offer, by an exploratory and descriptive research, qualitative character who works as the information from the different parties that are directly exposed to it, namely: students, teachers, course coordinators and employers. During its development, semi-structured questionnaires were applied with the sample comprising the subjects already listed. It was analyzed through the perception of respondents, therefore, the relevance of courses offered by two universities located in São Paulo. It should be noted that this analysis took place in order to verify and understand if, in their academic proposals, to identify situations and content aligned to the interests of the future gastronomy professional.

Key-Words

Graduation. Technology. Gastronomy. Professional Education. Labor Market Institutions

Introdução

Até pouco tempo atrás a gastronomia (culinária) no Brasil circunscrevia-se as refeições servidas em casa, ligadas as famílias e as mães, restrita ao âmbito familiar, e aos poucos e modestos restaurantes existentes que se valiam da experiência de seus donos. Geralmente eram imigrantes que se estabeleciam com casas típicas (cantinas, rotisseries, bistrôs e choperias).

No Brasil, principalmente a partir dos anos 1960, alguns cursos de culinária ministrados por culinaristas patrocinadas por empresas do setor alimentício era o mais próximo que se podia chamar de formação em gastronomia, conforme expõe BARRETO e SENRA (2001): ‘’Até meados dos anos 1960 reinavam absolutos os centros culinários formados nessa ótica, os quais desenvolviam suas atividades no foco da dona de casa, preocupada em habilitar-se, visando a complementação da renda familiar ou o aprimoramento de seus “pendores” domésticos”.

No final do período conhecido como o Estado Novo (1937 a 1945), as diretrizes governamentais com relação a educação deram ênfase a formação técnica e profissionalizante. Assim, criou-se em 1942 o SENAI (Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial) e, em 1946, o SENAC (Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial) este com forte vocação para o ensino e treinamento nas áreas de hotelaria e gastronomia.

Já os primeiros cursos de gastronomia na cidade de São Paulo foram oferecidos na Universidade Anhembi Morumbi em 1999 e no Centro Universitário das Faculdades Metropolitanas Unidas em 2000.

Sendo o ensino universitário de gastronomia no Brasil relativamente recente, é visível que, no âmbito dos diversos projetos pedagógicos oferecidos, mesmo alinhados às Diretrizes Curriculares para a oferta de curso com formação em tecnologia, o conteúdo programático dos cursos enfatiza a principio, a formação técnica. Visam assim, por pressuposto, a capacitação plena dos aspirantes a chef nas técnicas e habilidades essenciais da função.

Assim sendo, o objetivo geral desta pesquisa é investigar e avaliar, por meio de diferentes atores, se os cursos oferecidos pelas Universidades apresentam-se alinhados aos interesses diretamente envolvidos na graduação tecnológica em gastronomia.

Neste sentido, na avaliação estrutural da formação de tecnólogos em gastronomia, o projeto pedagógico deveria ser entendido como um processo em constante reformulação, trazendo na globalidade das experiências da formação acadêmica propostas relacionadas à dinâmica do aprender a aprender em razão das necessidades e indicadores oferecidos pelo próprio mercado.

De acordo com Nascimento (2001) “o projeto pedagógico aponta um rumo, uma direção, um sentido explícito para um compromisso estabelecido coletivamente”. Na visão do autor para que a concepção do projeto pedagógico seja possível é importante enfrentarmos algumas dificuldades e ousadias, pois necessitamos de um referencial que fundamente a construção do projeto.

A metodologia a ser utilizada na pesquisa em questão, além de seu caráter exploratório, consistirá na análise qualitativa da oferta de cursos tecnológicos em gastronomia de instituições de ensino superior que oferecem a graduação, com a intenção de ouvir dos distintos atores – alunos, coordenadores de curso, docentes e empregadores – suas impressões, seus conceitos e sua visão acerca de pontos entendidos como relevantes para o cenário e a propriedade do ensino superior da gastronomia no Brasil.

Na adoção de uma amostra mais pontual a essa análise, considera-se, além dos sujeitos presentes diretamente no programa da graduação, a figura do empregador fundamental para uma avaliação diagnóstica da relevância ou não dos cursos oferecidos, na medida em que o processo se finaliza com o ingresso dos tecnólogos no mercado de trabalho.

Assim, a investigação em relação ao tema proposto, ou seja, a formação do tecnólogo em gastronomia e a oferta dos currículos universitários, bem como sua inserção no mercado de trabalho, se organizam em situações pontuais e planejadas com a aplicação de questionários em uma amostra não intencional, haja vista que a opção se fez em razão de uma leitura não tendenciosa em relação aos sujeitos da pesquisa.

Para que a análise dos resultados se desse de forma pontual em relação às questões que envolvem o ensino superior em gastronomia, optou-se por um recorte de pesquisa que incide em investigar os cursos na cidade de São Paulo que tem formalizados seu reconhecimento e que sejam oferecidos na modalidade de tecnólogos.

Pesquisa com os Atores

A investigação em relação ao tema proposto, ou seja, a formação do tecnólogo em gastronomia e a oferta pedagógica dos currículos universitários, além da inserção no mercado de trabalho, conforme já discorrido nas considerações introdutórias se dividiu em quatro situações pontuais.

1 – Corpo Discente

Na intenção de entender a visão dos alunos que freqüentam regularmente a graduação tecnológica em gastronomia, acerca do cenário dos cursos de Gastronomia, trabalhou-se com uma amostra aleatória de trinta e quatro respondentes, de duas Instituições de Ensino Superior diferentes, ambas localizadas na cidade de São Paulo, com entrevistados matriculados nos diversos semestres dos cursos.

Indagados acerca do conhecimento do projeto pedagógico oferecido onde nas respostas dos entrevistados, evidenciou-se o significativo numero de 20 discentes registrando que não tem conhecimento do projeto pedagógico oferecido pelo curso no qual os mesmos desenvolvem suas atividades acadêmicas.

Outros entrevistados, num percentual menos significativo, mesmo externando o fato de não conhecerem o projeto pedagógico de seu curso, manifestam-se, colocando que “admiram muito o Projeto Pedagógico e a estrutura de nossa universidade”, o que pode sinalizar um viés quanto ao fato de estarem inteirados da proposta pedagógica, satisfazendo-se, por pressuposto, de informações prestadas na rotina da graduação, que, eventualmente tratem de questões pertinentes aos projetos.

Ainda quanto ao conhecimento do projeto, a evidência por parte dos entrevistados sinaliza que, a partir dele, parte dos respondentes concluiu “ter feito a escolha certa”, inclusive desmistificando uma idéia inicial errada, na medida em que até o momento anterior ao conhecimento da proposta pedagógica alguns “achavam que a gastronomia fosse cozinha […] até que descobri que envolve, também, administração etc.”.

Quando convidados a se manifestarem sobre a matriz curricular ofertada pela IES no que se refere à carga horária, 24 dos respondentes apontaram que a mesma é suficiente, afirmando que “auxilia no horário para quem precisa trabalhar” e “é bem transparente e sei o que tem no curso inteiro”. Outras respostas incidentes registram “que pode melhorar” e “se aprende o necessário para ingressar no mercado de trabalho”.

Dos 10 que afirmaram ser insuficiente a carga horária oferecida, os comentários mais incisivos foram: “seria bom que pudéssemos ampliar nossa grade em algumas disciplinas”; “a carga horária é muito curta”; “devíamos ter mais aulas práticas”; “em algumas disciplinas é impossível interagir totalmente na aula por falta de tempo” e, por fim, o sentimento que leva a solicitar “mais tempo de aula”.

As 24 respostas concordando que a carga horária é suficiente permite avaliar que, para muitos dos alunos, o curso, nos seus propósitos, atende aos seus objetivos de formação e colocação imediata no mercado de trabalho.

Na análise dos resultados obtidos na categoria mercado de trabalho, questão inicialmente abordando acerca da absorção, pelo mercado de trabalho, dos profissionais formados pela Universidade, 18 dos discentes respondeu ser muito positiva.

Cabe registrar que 12 dos que responderam ser positiva a relação entre egressos e mercado de trabalho.

A última questão destacou acerca do fato de ser ou não fundamental a formação superior para o exercício da profissão. Os resultados mostram que 16 dos respondentes concordam plenamente com essa afirmação.

2 – Coordenadores de Cursos de Tecnologia em Gastronomia

A fim de conhecer a opinião dos coordenadores de cursos de graduação tecnológica em gastronomia a respeito dos cursos que dirigem partiu-se de uma amostra de oito coordenadores oriundos de seis escolas localizadas na cidade de São Paulo que oferecem a graduação tecnológica em gastronomia. A opção pela coleta de dados de Coordenadores em mais de duas IES foi com o intuito de obter uma amostra mais significativa nos resultados. O fato de haver mais de um coordenador por escola se deu por especificamente em uma das IES existir a figura de coordenador adjunto e em outra, um coordenador operacional trabalhando em conjunto com o coordenador acadêmico.

Quando perguntados sobre a oferta de graduação tecnológica em gastronomia no país as respostas foram: “aumento excessivo da oferta em prejuízo ä qualidade”; “a oferta esta coerente com a demanda de mercado”; e “muita oferta, pouca qualidade”.

Nas respostas sobre a questão referente a oferta de graduação tecnológica em gastronomia nota-se a preocupação, na fala dos coordenadores, com o excesso de oferta, principalmente na região sudeste.

A qualidade é outro fator de preocupação por parte dos coordenadores em relação à excessiva oferta de cursos, pois os mesmos conhecem as necessidades de infra-estrutura para o bom andamento das aulas e da qualificação de seus professores.

Passando-se para a categoria projeto pedagógico, obteve-se nas respostas que a maioria afirma que o projeto das Instituições em que atuam não é o original, o primeiro construído a partir da oferta do curso, alegando que os mesmos mudaram várias vezes, e que a condução do estado da arte se deu através de construção coletiva.

Outro resultado obtido mostrou que os entrevistados acreditam que o Projeto em questão está alinhado ás diretrizes do MEC, destacando-se as respostas abaixo: “há necessidade de atualização, porém aguardamos visita da Comissão de Especialistas do MEC para reconhecimento”; “sim, somos orientados para tal”.

Quando indagados acerca da grade curricular e carga horária todos os entrevistados – citaram que esta é suficiente e, com relação à relevância das disciplinas, a maioria alegou serem as mesmas necessárias e oportunas.

Quanto às disciplinas que não estão contempladas nos projetos pedagógicos e que seriam importantes à formação do egresso os entrevistados alegaram que disciplinas como Food Service e Restaurante seriam essenciais para a formação do aluno.

No tocante a mercado de trabalho, os entrevistados alegam que o mesmo tem evoluído e proporcionado amplas oportunidades, citando, no entanto o preconceito como ponto negativo.

Questionados se a formação superior em gastronomia é requisito fundamental para a atuação profissional, 50% dos respondentes alegaram que sim e outros 50% alegaram que não. Metade dos coordenadores apesar de concordarem que existem inúmeros profissionais bem sucedidos considera fundamental a capacitação através dos cursos superiores em gastronomia.

Os entrevistados, em sua maioria, consideram que a formação docente é vital para o curso em questão, indo além dos requisitos de conhecimentos práticos, mas poderia ser estabelecida uma política de utilização da base teórica e da vivência prática, sensibilizando e proporcionando ao docente entender que a especialização é condição fundamental para a qualidade do curso.

Sob ponto de vista dos coordenadores, apesar da experiência profissional em operação de restaurantes de grande parte dos respondentes, todos concordam que a titulação exigida pelo MEC para os docentes de cursos superiores é fundamental para o crescimento dos cursos de gastronomia.

3 – Corpo Docente

Com o intuito de conhecer a imagem e conceitos dos professores em relação aos cursos em que ministram aulas, trabalhou-se com uma amostra aleatória de onze docentes, alocados em duas diferentes IES.

Em relação à oferta da graduação tecnológica em gastronomia observou-se que a maioria dos respondentes é unanime em afirmar que a oferta é grande, porém com pouca qualidade.

Na verificação referente à ciência do projeto pedagógico pelos docentes entende-se que 58% dos docentes disseram ter conhecimento do mesmo, enquanto outros 42% afirmam desconhecer tal projeto.

Quando questionados se são convidados a discutir o Projeto Pedagógico do curso em que lecionam, 7 dos docentes afirmam que são convidados e os demais manifestam-se dizendo que não são convidados ä discuti-lo.

Com relação às Diretrizes Curriculares Nacionais – DCN, os mesmos 7 que afirmam conhecê-las observaram que: “são muito abrangentes”; “pouco especificas”; “fora da realidade”; “ainda precisam de aprimoramento e adequação.

Destaca-se que 7 dos respondentes afirmam que a carga horária é insuficiente. Outros 4 dos respondentes acreditam ser suficiente a carga horária e comentam que “para tecnólogo está suficiente, para bacharel seria o dobro”.

Na categoria mercado de trabalho, quando perguntados sobre a absorção dos egressos pelo mercado de trabalho, 3 dos respondentes acham positiva. Também, 6 da amostra de docentes acham “muito positivas”. Dentre essas as afirmações aparecem as seguintes colocações: “a prática ainda é muito valorizada”; “’é necessário prática para completar o profissional”. Outros 2 em contrapartida consideram “pouco positiva” a absorção pelo mercado, pois, de acordo com os respondentes “não existe necessidade de formação para os cargos relativos à profissão” e “os profissionais que saem da universidade ainda estão despreparados ou descomprometidos com as necessidades e expectativas do mercado”.

Em relação a necessidade de qualificação permanente, de titulação e de experiência profissional, houve unanimidade entre os respondentes quanto a importância de unir esses dois viesses, experiência profissional e busca de titulação sendo fundamental o equilíbrio entre ambos.

Porém, também alertam que mais difícil para os profissionais ditos “de mercado” buscar essa qualificação através de programas de Lato-senso ou Stricto-sensu e até mesmo uma graduação, uma vez que ä atividade nos empreendimentos gastronômicos demanda uma grande dedicação de tempo.

4 – Empregadores

O grupo de empregadores contou com cinco respondentes, todos com histórico de contrato de estagiários ou egressos do curso de gastronomia. Essa amostra revelou-se fundamental para uma avaliação diagnóstica da relevância ou não dos cursos oferecidos, na medida em que o processo se finaliza com o ingresso dos tecnólogos no mercado de trabalho.

Em relação ao curso tecnólogo em gastronomia, quando indagados acerca da oferta de graduação tecnológica em gastronomia no país, de acordo com o ponto de vista de cada um, as respostas mostraram que a oferta é considerada completa, satisfatória, em crescimento. No entanto alegaram, ainda que o excesso de vagas está prejudicando o mercado.

Quando indagados acerca da percepção quanto à formação de tecnólogos para o segmento da restauração todos responderam ser esta proposta de ensino insuficiente.

Quando se indagou sobre o entendimento dos entrevistados em relação à contratação dos profissionais formados pelas Universidades quatro dos respondentes afirmaram ser positiva, com dois deles declarando ser fundamental a formação superior para a área de Gastronomia e outros dois respondendo que não concordam com esta afirmação. Um dos entrevistados se manifestou concordando parcialmente.

Os entrevistados afirmaram ainda que é real o preconceito em relação à contratação de profissionais formados pelas Universidades, sendo este preconceito relacionado a questões de ordem sócio-econômica e também na razão de falta de preparo para as exigências do segmento e inexperiência nas prática operacionais.

Indagados acerca da posição pessoal em relação aos profissionais de cozinha formados pelas Universidades os entrevistados alegaram que a grande maioria dos alunos saem despreparados do curso, sem a postura correta para as características de um profissional de cozinha, concretizando, por conseqüência, um choque cultural dentro dos estabelecimentos, haja vista a ausência de entendimento acerca da rotina trabalho X salários, entre outros aspectos.

O que se pode analisar das respostas destes empregadores é que na realidade a prática e o cenário por eles vivenciados são diferentes da percepção e sentimento de professores e coordenadores dos cursos de Gastronomia. Pelo teor das informações obtidas na totalidade desta pesquisa, estes últimos consideram que todo o cenário apresenta-se positivo e com denotada qualidade. Já os empregadores consideram o cenário em discussão despreparado, alimentando uma falta de conhecimento da realidade por parte dos alunos.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A educação superior tem vivenciado uma revolução nos seus cursos e modalidades de ofertas. Cooperaram para esse fenômeno as modificações no mundo do trabalho advindos do avanço tecnológico, da globalização e das redes de informação que ocasionaram mudanças nos produtos, habilidades, processos e competências profissionais.

A educação profissional no Brasil tem evoluído, esta é uma realidade. No entanto, o mercantilismo da educação muitas vezes faz proliferar as mais diversas instituições de ensino superior, muito delas sem o devido preparo para atender a demanda e as necessidades reais do mercado de trabalho.

No cenário do curso de gastronomia, objeto desta investigação, foi possível perceber nas respostas dos entrevistados um verdadeiro conflito entre o que dizem alunos, professores, coordenadores e principalmente empregadores.

Através da leitura e análise dos dados levantados pelos questionários respondidos pelos atores envolvidos nos cursos de gastronomia observa-seque os alunos respondem que estão satisfeitos com o curso e que, com alterações mínimas o curso pode melhorar. Os coordenadores, por sua vez acreditam estar oferecendo projetos pedagógicos e grades curriculares excelentes. Já os professores sentem que estão preparando os alunos para o mercado e os empregadores, por sua vez, percebem que os alunos estão despreparados para a realidade do trabalho em uma cozinha profissional.

Suadeau (2004, p.76 e 77), enfatiza sobre o desempenho dos alunos e egressos do curso de gastronomia nos restaurantes que: “[..] muitos candidatos a cozinheiro saídos das faculdades não aceitam ser mandados e tem dificuldade de se enquadrar no esquema de obediência próprio de uma cozinha…Se dou “bronca” a bem do serviço, e o estagiário reage mal, não me serve. Os jovens das escolas são muito suscetíveis. A profissão não é assim”.

Esse sentimento foi corroborado pelas falas dos empregadores que destacam que tecnicamente (ou na prática) os estudantes ou egressos são bons, porém em relação ao conhecimento da “realidade de uma cozinha” deixam a desejar, não se enquadrando à rotina dos horários e, por vezes, não se sujeitando às atividades mais simples como limpeza geral e preparações básicas.

Os estágios obrigatórios, previstos pelas Diretrizes Curriculares Nacionais para os cursos de tecnologia, não deveriam suprir essa lacuna? Essa experiência “além muros” não seria suficiente para apresentar ou melhorar a percepção da “realidade da profissão” ao futuro profissional?

Sente-se a necessidade de ampliar a pesquisa ora apresentada a um maior numero de respondentes, envolvendo outras universidades ofertantes da graduação tecnológica em gastronomia, no âmbito da cidade de São Paulo e do Brasil, com a finalidade de obter um resultado mais legitimo.

Neste cenário, a formação do tecnólogo em gastronomia deve acatar a necessidade de uma formação sólida, e não somente aquela que visa acolher às necessidades do mercado da gastronomia atual.

Outra conclusão deste estudo é que diante do cenário da pesquisa feita, o projeto pedagógico deve ser um instrumento que motive alunos, exposto de forma permanente pelos professores, onde os alunos tenham com o projeto contato constante.

O que está acontecendo na realidade com os cursos de gastronomia? O que pode ser feito diante do cenário apresentado por esta pesquisa?

Aos coordenadores cabe atualizar sempre o curso em questão, promovendo palestras de profissionais na área, debates que mostrem as dificuldades da área e não somente o glamour de ser um chef. Outra constatação é com relação à falta de conhecimento do projeto pedagógico, que deveria ser intensamente e incansavelmente apresentado e discutido entre o corpo discente para que auxiliasse no entendimento do curso e da profissão e com o corpo docente com vistas a promover uma melhor integração interdisciplinar e ajustes nos planos de aula de cada disciplina.

Aos docentes é preciso que entendam que o que eles oferecem nas instituições é uma parcela importante, mas não é tudo, devendo estes indicar aos alunos a realidade do mercado e a necessidade de maiores conhecimentos fora da faculdade além do seu aprimoramento docente através de cursos de pós graduação.

E por fim aos alunos cabe o papel de estar cada vez mais cientes de que um curso deste tipo não é sinônimo de sucesso. O sucesso na área de gastronomia, como comprovado nos resultados da pesquisa, vem derivado de uma soma de conhecimentos, de experiências adquiridas da paixão pela profissão e principalmente pelo aprimoramento constante de saberes, o que nem sempre uma instituição de ensino superior pode promover.

Espera-se, com os resultados apresentados, estimular outros pesquisadores a se debruçarem sobre um tema ainda pouco estudado, oferecendo idéias e caminhos para o desenvolvimento de novas pesquisas tendo como objeto as nuances de um curso em continua transformação. Assim será possível acompanhar a evolução dessa formação superior, bem como os seus impactos no mercado de trabalho, discutindo e refletindo sobre a realidade e as perspectivas da formação do tecnólogo em gastronomia no Brasil.

REFERÊNCIAS

  • BARRETO, Ronaldo e SENRA, Asdrúbal Vieira. A gastronomia e o turismo. In: ANSARAH, Marília Gomes dos Reis (org.) Turismo: como aprender, como ensinar. São Paulo: SENAC, 2001. p.391
  • BRASIL. Ministério da Educação. Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira. Cadastro das Instituições de Educação Superior. Brasília, DF, 2009 Acesso em: 5 maio 2009.
  • NASCIMENTO, R. C. Visão Estrutural da Evolução dos Cursos Superiores de Turismo: A realidade atual. Dissertação de Mestrado: Universidade de São Paulo, 2001
  • SENAC. Serviço nacional de aprendizagem comercial. Muita história para contar. Disponível em:http://www.sp.senac.br/jsp/default.jsp?newsID=a718.htm&testeira=457
  • SENAI. Serviço nacional de aprendizagem industrial. História institucional. Disponível em: http://www.senai.br/br/Institucional/snai_his.aspx.
  • SUADEAU, Laurent. Cartas a um jovem chef: caminhos no mundo da cozinha. São Paulo: Elsevier, 2004.
MINICURRÍCULO DOs AUTORes

MARCELO NERI BELCULFINE. Mestre em Hospitalidade pela Universidade Anhembi Morumbi, Especialista em Administração e em Docência em Gastronomia, Coordenador do curso de Gastronomia da Universidade Anhembi Morumbi.
RENÊ CORRÊA DO NASCIMENTO. Graduado em Turismo com Mestrado e Doutorado em Ciências da Comunicação pela Universidade de São Paulo. Atualmente é Professor Titular e Pesquisador do Mestrado em Hospitalidade da Universidade Anhembi Morumbi. Professor Doutor do curso de Turismo na Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo.

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